DISCURSO DE ABERTURA DE SUA EXCELÊNCIA JOÃO MANUEL GONÇALVES LOURENÇO, PRESIDENTE DA REPÚBLICA DE ANGOLA E PRESIDENTE EM EXERCÍCIO DA UNIÃO AFRICANA, NA 2ª CIMEIRA ÁFRICA-CARICOM

 


Sua Excelência Abiy Ahmed Ali, Primeiro-Ministro da República Democrática Federal da Etiópia e Anfitrião da Conferência;  

Suas Excelências Chefes de Estado e de Governo de países africanos e do CARICOM;  

Sua Excelência Andrew Holness, Primeiro-Ministro da Jamaica e Presidente da Comunidade das Caraíbas;  

Suas Excelências Representantes de Chefes de Estado e de Governo;  

Sua Excelência António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas, aqui representado pelo Senhor Parfait Onanga-Anyanga, responsável do Bureau de ligação da ONU com a União Africana;  

Sua Excelência Mahamoud Ali Youssouf, Presidente da Comissão da União Africana;  

Sua Excelência Carla Barnett, Secretária-Geral da Comunidade das Caraíbas;  

Membros do Corpo Diplomático acreditado em Adis Abeba;  

Excelências;  

Minhas Senhoras, Meus Senhores;  


É com muita honra e um profundo sentimento de irmandade que tomo a palavra na minha qualidade de Presidente em exercício da União Africana, para tecer algumas considerações na abertura desta magna assembleia, que reúne, pela segunda vez (desta feita presencialmente), os máximos representantes dos países membros da União Africana e da Comunidade das Caraíbas.


Permitam-me que saúde calorosamente, em nome das delegações aqui presentes, o Governo e o povo da República Democrática Federal da Etiópia, pela calorosa hospitalidade que nos está a proporcionar nestes dias de trabalho aqui na sede da União Africana, nesta magnifica cidade de Adis Abeba.


Estamos reunidos hoje não apenas por afinidades históricas, mas fundamentalmente pela determinação comum de transformarmos as cicatrizes do passado em pontes de solidariedade, cooperação e justiça.


Em 7 de Setembro de 2021, devido às contingências da COVID-19, realizámos no formato virtual a primeira Cimeira África-CARICOM, durante a qual as nossas deliberações sinalizaram a importância de encontros posteriores e hoje, exactamente quatro anos depois, estamos juntos novamente.


Pretendemos fazer desta Cimeira um importante momento de articulação global entre africanos e afrodescendentes em busca da reafirmação da nossa dignidade e da conjugação de esforços voltados para a cooperação política, económica, social e cultural, assentes na história comum e nos laços de consanguinidade que nos unem.


Neste segundo encontro, que se subordina ao lema “Parceria Transcontinental na Busca da Justiça para os Africanos e os Afrodescendentes através de Reparações”, sobressai o facto de esta Cimeira, em função do seu tema, ter um simbolismo muito especial, por se alinhar com a decisão da União Africana de consagrar o ano de 2025 à questão da “Justiça para os Africanos e Afrodescendentes através de Reparações”. 


Isto abre uma ampla frente comum, num quadro de parceria transcontinental entre a União Africana e a CARICOM, com a perspectiva de reforçarmos a nossa luta pela justiça reparatória a nível global.


Devemos procurar evoluir para decisões que viabilizem a realização dos nossos objectivos e é com esta finalidade que considero fundamental que pensemos nas formas de criarmos as bases necessárias à utilização de ferramentas já disponíveis no âmbito da Reparação, de que destaco o Mecanismo Afro-Caribenho de Justiça Reparatória e o Fundo Global de Reparação.


Estas ferramentas servirão de instrumentos facilitadores da colaboração entre órgãos da União Africana e da CARICOM, visando a definição de estratégias, o alinhamento de políticas e a promoção de acções eficazes e conjuntas sobre reparações, tanto no plano político como no jurídico.


Excelências,


Esta Cimeira é, na verdade, uma oportunidade para reflectirmos sobre todos os factos da História que nos unem e na necessidade de pensarmos num modelo de acção comum e numa estratégia que revigore a nossa força gerada pela dor e pelo sofrimento do passado colonial.


Só assim vamos encetar um caminho conjunto que nos conduza ao progresso, ao desenvolvimento, ao bem-estar das gerações presentes e futuras de africanos e afrodescendentes e ao fim do ciclo de pobreza que ainda assola os nossos países e as nossas regiões.


Constatamos com grande satisfação que há uma dinâmica que nos faz acreditar na concretização dos nossos objectivos comuns e, neste aspecto muito particular, gostaria de realçar os importantes progressos que se vêm registando no âmbito da nossa cooperação, de que destaco a instalação do Escritório do AfreximBank nas Caraíbas.


Este importante passo de aproximação abriu novas oportunidades de comércio e investimento, a realização dos Fóruns Afro-Caribenhos de Comércio e Investimento já na sua 4.ª edição, que têm aproximado empresários e governos das duas regiões, bem como a assinatura a 26 de Setembro de 2024 de um Memorando de Entendimento entre a União Africana e a Comunidade das Caraíbas.


Entendemos que isso vai reforçar a cooperação em áreas estratégicas como o comércio, o transporte, a educação, a ciência, a cultura e o apoio mútuo em desafios globais.


Ainda há compromissos não concretizados e, por isso, devem passar a constar das nossas prioridades a definição de um roteiro claro e objectivo que nos leve tão rapidamente quanto desejável a estabelecer uma Plataforma Conjunta de Comunicação e Media, a assinatura de um Acordo Multilateral de Serviços Aéreos e de isenção de vistos.


Precisamos de rever os regimes de vistos e criar voos directos entre África e as Caraíbas, de criar uma Parceria Público-Privada África-CARICOM para mobilização de recursos e de lançar o Fórum de Territórios e Estados Africanos e Caribenhos.


Penso que devemos potenciar esforços para implementarmos as nossas decisões e transformá-las em benefícios duradouros e concretos para os nossos povos, na base de um intercâmbio intenso e activo nos principais domínios da nossa cooperação, designadamente no económico, com vista a estimular o comércio e o investimento nos sectores da energia, da tecnologia digital, da agroindústria e da economia azul.


No domínio cultural, visando aprofundar o intercâmbio educativo, artístico e desportivo que reforçam a nossa identidade partilhada e no social, no sentido de dar voz activa à juventude, às universidades, aos centros de pesquisa e investigação científica e às organizações culturais da diáspora.


Excelências,


Temos objectivos claros e devemos procurar estabelecer os mecanismos que facilitem a sua implementação e, por esta razão, proponho a criação de Subcomités Técnicos Permanentes que integrem representantes da União Africana e do CARICOM, compostos por especialistas, representantes ministeriais e parceiros da sociedade civil e do sector privado.


Devem centrar o seu trabalho em áreas de interesse estratégico comum, apresentar propostas concretas para se promover o investimento na produção de vacinas, na inovação agrícola e noutros sectores que podem dar suporte ao nosso desenvolvimento comum.


É importante actuarmos de forma coordenada para ajudarmos a impulsionar as reformas que se impõem na arquitectura financeira global, de que depende, em grande medida, uma abordagem mais justa sobre a questão da dívida e da disponibilização de recursos financeiros para a realização de projectos estruturantes e impulsionadores do progresso em África e na região do CARICOM.


Em todas as estratégias que delinearmos, a juventude deve ocupar um lugar central e, por isso, considero ser pertinente que se procure institucionalizar o Conselho da Juventude União Africana-CARICOM como um órgão consultivo permanente, assegurando-se assim que as novas gerações sejam o eixo em torno do qual gravitará a construção do nosso futuro comum.


Excelências,


Vivemos actualmente uma época marcada por grandes mudanças a nível global, que vão desde a crise climática, passando pela insegurança alimentar e energética, a instabilidade geopolítica, as migrações forçadas, até às pressões económicas extremas.


São desafios que afectam de forma particularmente intensa os países do Sul global, especialmente os de África e das Caraíbas, por serem os que estão mais desprovidos de meios e recursos para fazer face a estes fenómenos.


Os factos que referi tornam-se mais gravosos no contexto actual de uma acentuada fragilização das instituições multilaterais que, por incidirem de um modo bastante preocupante em África e nas Caraíbas, devem obrigar-nos a um esforço de cooperação mais firme no sentido da defesa e da promoção constante de um multilateralismo abrangente em que caibam todos os povos e nações em igualdade de circunstâncias e sem a marginalização a que africanos e caribenhos sempre estivemos votados.


Por isso impõe-se que realizemos, de forma coordenada, esforços convergentes no sentido de que fique demonstrada a inevitabilidade da reforma do sistema das Nações Unidas, em particular do Conselho de Segurança, para que este importante órgão, reflectindo a realidade do mundo dos nossos dias, possa num contexto de equilíbrios dos diferentes interesses geopolíticos, desempenhar cabalmente o seu papel de garante da paz e segurança mundial, saindo do marasmo e da quase inoperância em que se encontra no momento actual.


Em face do que acabei de referir, considero que os Estados africanos e caribenhos devem procurar defender em conjunto um multilateralismo capaz de responder aos desafios contemporâneos em matéria de paz e segurança, clima ou desenvolvimento sustentável, garantindo que, nas estruturas das instituições internacionais, haja uma representatividade que abarque as aspirações e os anseios dos povos de todos os continentes, nomeadamente dos excluídos de África, América Latina e Caribe, Ásia e Médio Oriente.


Tenho a certeza de que esta Cimeira representará um marco determinante na acção prática que doravante a África e as Caraíbas realizarão, para que as palavras carregadas de emoção e de esperança que serão proferidas durante este nosso encontro, se transformem no farol que nos guiará para um destino em que os povos africanos e caribenhos realizem os seus grandes anseios à prosperidade, ao bem-estar e ao progresso.


Desde esta tribuna, aproveitamos a ocasião para dizer ao povo palestino, que neste momento difícil que atravessam e enfrentam um verdadeiro genocídio, o mundo não está indiferente ao vosso sofrimento, estamos solidários com a vossa causa, a causa da luta pela criação do Estado da Palestina, para que os dois povos - palestino e judeu - possam viver em paz e harmonia, desenvolvendo relações de amizade e de cooperação económica.


Com estas palavras, declaro aberta a Segunda Cimeira África-CARICOM.  

Muito obrigado pela vossa atenção!

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